Direito Civil – O que é o Princípio da Indiferença das vias? (INF 792, STJ)

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Publicado por: PP
08/12/2023

Maria possui uma dívida com o Banco Itaú. Apesar de já ter sido reconhecida judicialmente a prescrição, o banco ainda insiste em enviar notificações postais e ligações com a cobrança da dívida.

É possível a cobrança extrajudicial de débito prescrito?

Não. No Resp 2.088.100/SP, o Superior Tribunal de Justiça  reconheceu que a prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

O reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

STJ. 3ª Turma. REsp 2.088.100-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17/10/2023 (Info 792).

 

A Ministra Nancy Andrighi destacou que o art. 189 do Código Civil de 2002 estabelece, expressamente, que o alvo da prescrição é a pretensão, instituto de direito material, compreendido como o poder de exigir um comportamento positivo ou negativo da outra parte da relação jurídica.

Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

 

Antes do advento da pretensão, já existe direito e dever, mas em situação estática. Especificamente no âmbito das relações jurídicas obrigacionais, antes mesmo do nascimento da pretensão, já há crédito (direito subjetivo) e débito (dever) e, portanto, credor e devedor.

A prescrição atua encobrindo a eficácia da pretensão. Como consequência, “o direito subjetivo continua a existir incólume, mas tem encobertas as suas exigibilidade e impositividade” (MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: Plano de Existência. 23. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2022).

Portanto, obrigação é composta pelos seguintes elementos:

a) crédito: é o direito subjetivo;

b) débito: é o dever;

c) relação obrigacional: é o vínculo obrigacional entre credor e devedor.

A dinamicidade do direito subjetivo surge, tão somente, com o nascimento da pretensão, que pode ser ou não concomitante ao surgimento do próprio direito subjetivo. Somente a partir desse momento, o titular do direito poderá exigir do devedor que cumpra aquilo a que está obrigado.

A pretensão é o poder de exigir o crédito. No entanto, mesmo que ausente a pretensão, diante da prescrição, os demais elementos obrigacionais persistem. Inclusive, é possível o pagamento de dívida prescrita voluntariamente pelo devedor, que não pode exigir o valor de volta.

Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.

 

A pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias, isto é, pode ser exercida tanto judicial, quanto extrajudicialmente.

Extinta a pretensão, não é mais possível cobrar o devedor nas vias judicial ou extrajudicial.

Nas palavras da Ministra Nancy Andrighi:

A doutrina adverte que “a consequência processual de não poder se servir da ‘ação’, no entanto, não tem o condão de explicar o instituto. Trata-se de um resultado decorrente de uma prévia eficácia que se sucedeu no direito material”. Nessa esteira de intelecção, não se pode olvidar, ainda, que a “pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias, isto é, pode ser exercida tanto judicial, quanto extrajudicialmente”.

Nesse sentido, ao cobrar extrajudicialmente o devedor, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão, ainda que fora do processo. Se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada em razão da prescrição, não será mais possível exigir o referido comportamento do devedor, ou seja, não será mais possível cobrar a dívida. Logo, o reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

Não há, portanto, duas pretensões, uma veiculada por meio do processo e outra veiculada extrajudicialmente. Independentemente do instrumento utilizado, trata-se da mesma pretensão, haurida do direito material. É a pretensão e não o direito subjetivo que permite a exigência da dívida. Uma vez prescrita, resta impossibilitada a cobrança da prestação. Nessas situações, não há que se falar em pagamento indevido, nem sequer em enriquecimento sem causa, nos termos do art. 882 do Código Civil, uma vez que o direito subjetivo (crédito) continua a existir. O que não há, de fato, é a possibilidade de exigí-lo.

STJ. 3ª Turma. REsp 2.088.100-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17/10/2023 (Info 792).

 

Portanto, o princípio da indiferença das vias impede a cobrança extrajudicial de dívida prescrita. 

Até a próxima a bons estudos!

@pedrogualt

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