Um dos pontos do programa de Direito Constitucional no edital da PGE/RN é “Controle de Convencionalidade”, inserido como subtópico do ponto de “Direitos, deveres e garantias fundamentais”. Do mesmo modo, o tema é uma grande aposta para a PGE/SP, notadamente em relação ao programa de Direitos Humanos e Direito Constitucional. Por fim, trata-se de um tema que tem ganhado relevância na prática jurídica e que enseja um ponto de contato entre o Direito Constitucional e o Direito Internacional, especialmente em matéria de direitos fundamentais. Por esse motivo, dedicaremos algumas linhas para tratar do aspecto relacionado ao exercício desse controle no âmbito nacional e internacional.
Conceito: Controle de convencionalidade é a análise da compatibilidade das normas nacionais de um Estado tendo como parâmetro as normas de direito internacional, em especial, mas não apenas, os tratados internacionais. Quanto aos efeitos desse controle, é possível que resulte em um efeito negativo ou destrutivo, que consiste na invalidação dos atos praticados em desconformidade com o parâmetro, ou um efeito construtivo, que consiste na interpretação das normas nacionais com base no direito internacional (interpretação conforme as convenções internacionais).
Controle de convencionalidade de matriz nacional: Trata-se da análise de compatibilidade feita por um órgão nacional. Vale destacar que, notadamente quanto aos tratados internacionais de direitos humanos, todos os órgãos públicos devem exercer esse controle de convencionalidade no exercício das suas atribuições, mas ganha destaque o exercício desse controle pelos tribunais nacionais, notadamente o Supremo Tribunal Federal.
No controle de matriz nacional, será considerado o status normativo atribuído à norma internacional pelo ordenamento jurídico interno. Apenas se a norma internacional só servirá de parâmetro se for superior à norma objeto do controle, de modo que algumas normas podem não estar sujeitas a esse controle (ex.: No Brasil, um tratado internacional com status supralegal não pode servir de parâmetro para controle de normas constitucionais). Não há, portanto, uma primazia da norma internacional como parâmetro de controle de todo o ordenamento jurídico nacional.
Obs.: Para alguns autores (ex.: André de Carvalho Ramos), o controle de convencionalidade de matriz nacional é, na realidade, um controle de legalidade, supralegalidade ou constitucionalidade, a depender do status normativo que a norma internacional tem no país.
Controle de convencionalidade de matriz internacional: Trata-se da análise de compatibilidade feita por um órgão internacional (ex.: Corte Interamericana de Direitos Humanos – Corte IDH, Corte Internacional de Justiça etc.). Diferente do controle de matriz nacional, a norma internacional é parâmetro para controle de todo o ordenamento jurídico nacional, até mesmo das normas constitucionais. De modo sintético, as normas internas não podem ser consideradas como pretexto para a violação das normas internacionais, em especial quando se trata de direitos humanos.
Um exemplo interessante é o caso “A Última Tentação de Cristo”, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. No julgado, uma norma constitucional chilena não foi admitida como escusa para violação a dispositivo da convenção, sendo reconhecido o dever de o país adequar o seu ordenamento jurídico às disposições do Tratado.
Qual decisão de controle prevalecerá?
Não são raras as vezes em que as decisões envolvendo o controle de convencionalidade têm resultados incompatíveis entre o que restou decidido no pelos órgãos internos e os órgãos internacionais. Um exemplo clássico que pode ser cobrado na sua prova é o entendimento acerca da validade da lei de anistia brasileira. Enquanto o STF considerou a norma constitucional (ADPF nº 153/DF), a Corte IDH condenou o Brasil por não ter implementado as medidas suficientes para apuração e responsabilização dos responsáveis pelos crimes de desaparecimento forçado e reafirmou sua jurisprudência no sentido de que as leis de anistia são incompatíveis com as obrigações previstas na Convenção Americana de Direitos Humanos (Caso Gomes Lund e outros).
Nesses casos, há um intenso debate sobre qual das decisões deveria prevalecer.
Sob a ótica dos direitos humanos, a tese mais forte é no sentido de que deverá prevalecer a decisão dos órgãos internacionais, pois estes seriam os órgãos incumbidos do controle definitivo de convencionalidade. A corrente se baseia, em especial, no risco de os órgãos do Estado adotarem interpretações próprias e peculiares para fundamentar a violação dos tratados internacionais de direitos humanos, de modo a criar uma aparência de cumprimento das obrigações internacionais a partir de leituras particulares destas obrigações (André de Carvalho Ramos chama esse fenômeno de truque do ilusionista). Portanto, seria nos órgãos internacionais a instância apropriada para avaliar a compatibilidade dos atos internos com os tratados internacionais, permitindo a criação de uma interpretação coerente e uniforme das obrigações neles contidas.
Indo além da mera imposição da decisão internacional à decisão nacional, a melhor doutrina defende que haja um diálogo entre as instâncias nacionais e internacionais resultando em uma “comparação recíproca e o diálogo interinstitucional” de modo a chegar a uma harmonia entre as ordens nacionais e internacional. Esse fenômeno é chamado de fertilização cruzada (cross fertilization).
Para que se considere efetivo o diálogo, a doutrina sugere a observância, pelos tribunais brasileiros, de alguns parâmetros ao tomarem decisões como a necessidade de mencionar a existência de dispositivos internacionais vinculantes ao Brasil relativos ao tema sob análise, de mencionar a existência de casos julgados por órgãos internacionais envolvendo o Brasil com temática relacionada ao caso menção à existência de jurisprudência etc.
O tema tem ganhado muita relevância, existindo iniciativas do CNJ para incentivar esse diálogo entre as instâncias nacional e internacional, como a criação da Unidade de Monitoramento e Fiscalização de decisões da Corte IDH no ano de 2021 que tem como objetivo a “concretização de uma cultura jurídica de direitos humanos no Judiciário nacional, em especial para a materialização das normas da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) e para a concretização das sentenças, medidas provisórias e opiniões consultivas proferidas pela Corte IDH em relação ao Estado brasileiro.”.
Espero que tenham gostado dessa breve abordagem sobre esse tema riquíssimo.
Bons estudos.
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